GIBRALTAR DO MAR VERMELHO

por Alvaro Monjardino

O Japão vai estabelecer uma base militar em Djibuti. Pequeno país com 600 000 habitantes, desde 1977 independente da França que ali se instalara a meados do século XIX e sem outros recursos além de ficar onde fica, Djibuti situa-se entre a Somália, a Etiópia, a Eritreia e a saída do Mar Vermelho para o Oceano Índico pelo estreito chamado Bab-el Mandeb. A base vai ocupar uma área de 12 hectares junto ao aeroporto ali existente, terá uma guarnição de 150 homens e a sua razão de ser está na pirataria que infesta, no Oceano Índico, as proximidades do Golfo Pérsico e do Mar Vermelho, e no correlativo intuito de proteger a frota mercante japonesa que daquele traz petróleo e por este demanda o Mediterrâneo via canal do Suez, por onde passa anualmente, em cerca de 2000 navios, um significativo volume das exportações japonesas, na sua maior parte a caminho da Europa.

Estas explicações vinham sendo persistentemente apresentadas pelo governo japonês em justificação do que não deixaria de ser um by-pass ao preceito constitucional que, imposto ao Japão depois de vencido na 2ª guerra mundial, o proíbe de enviar qualquer espécie de tropas para território estrangeiro, excepto a pedido do governo desse território, e ainda assim apenas podendo usar da força em caso de legítima defesa. Daí que, e até agora, o Japão só por ali mantinha duas fragatas com helicópteros que, secundadas por aviões P-3, cruzavam em permanência aqueles mares. Mas, com a assistência a estes equipamentos circulantes e o descanso das tripulações dependiam de bases terrestres alheias, o governo nipónico sempre alegara carecer de uma privativa. Conseguiu-o finalmente, em Dezembro último, por um acordo assinado com o governo de Djibuti (que provavelmente nele terá figurado como peticionário da vinda dos japoneses, para lhes respeitar a Constituição…) e pelo prazo renovável de um ano, mediante o pagamento anual de 30 milhões de dólares (22 milhões de euros). Foi, afinal, um pouco assim que, quando os chineses nos tomavam a sério, os portugueses se instalaram em Macau, no longínquo ano de 1557.

Com os norte-americanos mantendo igualmente em Djibuti uma base (guarnecida esta de 2000 homens) por outros 30 milhões de dólares, e os franceses uma outra com 2850 homens mediante mais 30 milhões de euros, eis o pequeno e pobre país fronteiro ao Bab-el-Mandeb a arrecadar 74 milhões de euros anuais graças ao seu préstimo, qual Gibraltar do Mar Vermelho, para os agentes da globalização temerosos dos perigos de ali à volta – e mesmo sem contarem ainda com o que entretanto vai pela banda norte desse mar...

Fonte: http://www.auniao.com/noticias/ver.php?id=22821 (04/02/2011)

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